Embora a legislação brasileira não estabeleça um padrão de cor para as embalagens de leite, elas possuem um padrão comercial que é seguido em todo o mundo. Desta forma a embalagem de leite integral é vermelha, o  semi-desnatado é verde e o  desnatado é azul.

Por ser um padrão, até então seguido por todas as marcas, os consumidores já se habituaram a colocarem, quase que automaticamente, a sua versão preferida no carrinho, sem se atentar para a descrição do rótulo.

Pois é……foi exatamente isso que aconteceu comigo. Costumo comprar regularmente o leite UHT semi-desnatado e outro dia fui surpreendida ao perceber que tinha comprado “gato por lebre” e trocado o leite semi-desnatado pelo  integral porque a cor da embalagem da minha versão preferida simplesmente mudou.

Então comecei a me questionar quais seriam os motivos desta mudança e me lembrei dos estudos de psicologia das cores aplicados ao marketing sensorial. 

Os psicólogos classificaram as cores como quentes (vermelho e amarelo) e frias (azul e verde).  Embora este assunto ainda seja controverso, pois devemos considerar as características individuais e culturais, quando se trata de interpretar o significado dessas cores, é consenso que a  cor é uma forma de comunicação capaz de expressar sentimentos, ideias e contextos e é muito usada como ferramenta de marketing para criar ligações emocionais com os consumidores por ser capaz até mesmo de modular o tempo que o consumidor permanece no ponto de venda.

De acordo com  Spence e Velasco (2018) a cor é talvez o elemento mais importante no design de embalagem pois ela desempenha um papel fundamental na captura da atenção do comprador no ponto de venda.  Uma cor distinta, ou esquema de cores, também pode atuar como um atributo valioso da marca.  

Dentro de muitas categorias, a cor é usada para transmitir informações tangíveis ao consumidor como o sabor ou até a classificação do produto de acordo com o teor de gordura, como é caso do leite. Além disso a cor também pode fornecer informações intangíveis como a percepção de atributos associados à marca, tais como:  premium, natural ou saudável.

Por isso o uso das cores de forma planejada na embalagem atua como facilitador fundamental no reforço da relação emocional e na tomada da decisão pelo consumidor. 

Sabendo de tudo isso fui em busca da interpretação das cores utilizadas na embalagem do leite e encontrei as seguintes informações descritas por Farina, Perez e Bastos (2006) para uso das cores na publicidade:

  • Vermelho: traz a referência da alimentação, aumenta a atenção, é estimulante e motivador; 
  • Verde: estimulante mas com pouca força sugestiva, oferece uma sensação de repouso.
  • Azul: possui grande poder de atração é neutralizante nas inquietações do ser humano, acalma o indivíduo e seu sistema circulatório.

Cruzando essas informações com a observação das cores de produtos de mercado observamos que os produtos mais indulgentes como o chocolate, doces em geral e as redes de fast food utilizam o vermelho para estimular o consumo, enquanto o verde é muito usado em produtos com apelo de saudabilidade e o azul é a cor padrão de produtos light ou de valor calórico reduzido.

Voltando então a embalagem de leite podemos supor que a indústria de laticínios está invertendo as cores dos leites integral e semi-desnatado, respectivamente de  vermelho para verde e vice-versa, com o objetivo de incentivar o consumo do leite semi-desnatado ao mesmo tempo em que desestimula o consumo do leite integral.

Mas quais seriam as motivações para isso?

Um bom motivo a ser considerado é o aumento da obesidade e a busca por alimentos mais saudáveis e com menos gordura, portanto faz sentido usar o vermelho para estimular o consumo do leite semi-desnatado que contém menos gordura e ao mesmo tempo características sensoriais mais próximo do padrão atual que é o leite integral. 

Então se a motivação é a saudabilidade por que isto não foi anunciado ao consumidor trocando direto a cor do leite integral pela cor do leite desnatado que tem menos gordura ainda? 

A resposta a esta pergunta está no perfil sensorial dos dois tipos de leite que são muito diferentes. Certamente o consumidor iria perceber e rejeitar a mudança, no entanto com a troca pelo produto intermediário (semi-desnatado) a diferença é menor e aos poucos o consumidor vai comprar sem perceber,  consumir e se  habituar ao perfil sensorial do leite semi-desnatado.

E o segundo bom motivo se deve ao fato de que vender leite semi-desnatado ao invés de leite integral é mais lucrativo para a indústria de laticínios, já que o preço de venda dos dois produtos são iguais, mas os custos de produção não são. O leite in natura possui cerca de 4% de gordura que ao entrar no laticínios é padronizado para o teor de gordura desejado de acordo com a classificação do leite em: integral (acima de 3%), semi-desnatado (0,51 a 2,9%) e desnatado (máximo de 0,5%), o excedente de gordura é o creme de leite que tem alto valor agregado para o laticínios.

Pronto…mistério desvendado. Você já tinha percebido essa mudança nas embalagens de leite?  Deixe aqui seus comentários e marque um amigo que se interesse pelo assunto.

Por Dra. Elaine Berges da Silva 

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Fontes:

FARINA, PEREZ e BASTOS. Psicodinâmica das Cores em Comunicação. Disponível em: https://issuu.com/gabrielviana5/docs/psicodin__mica_das_cores_em_comunic

SPENCE e VELASCO. On the multiple effects of packaging colour on consumer behaviour and product experience in the ‘food and beverage’ and ‘home and personal care’ categories. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.foodqual.2018.03.008